De todas as injustiças celestiais praticadas contra a mulher desde que Eva foi expulsa do Paraíso devido ao problema da maçã, a pior delas é a data limite para a concepção. Como todo bom feminista, acho uma injustiça não podermos fazer protestos no céu. Nessa hora, os avanços científicos são bem vindos e até funcionam como tal.

Quer dizer, já não basta a tripla jornada, a falta de compreensão e sensibilidade da maioria dos homens, elas ainda têm de correr com a vida para não perder o prazo de ser mãe? Soa até como tirania.

Obviamente, a medicina tem avançado, mesmo assim os especialistas explicam que é mais seguro dar à luz cedo. Vi na internet que a idade ideal para a mulher ter um filho é 28 anos. O ginecologista e obstetra, Nilo Bozzini, explicou em entrevista a Drauzio Varela que a idade máxima para a gravidez da mulher é 40 anos.

A psicóloga Rosely Sayão tem uma palestra, feita para a TV, que questiona: Filhos, melhor não tê-los? Na verdade, ela tratou sobre a maneira como os filhos estão sendo planejados, alertando que “para muitas famílias, ter filhos transformou-se em ato de consumo”. Ainda assim, isso nos provoca uma ponderação: se o construtor do universo e das pessoas pensou que todos nós viveríamos de sombra e água fresca no Paraíso, até entendo, mas será que não dava para refazer as regras quando Eva foi expulsa?

Não é possível para a mulher primeiro ter filhos para só depois cuidar de sua vida profissional. A menos que ela tenha muito dinheiro para empregadas e babás, etc. O que não é a mesma coisa. Alguém que decide passar nove meses pisando em ovos, colocar a relação matrimonial em risco, mudar toda a arquitetura da casa, abrir as pernas na frente de um monte de desconhecidos e sentir a pior dor “normal” que se conhece, certamente não vai querer deixar seu filho na mão dos outros. Pelo menos não todo o tempo.

Existem muitas executivas e profissionais liberais que chegam aos trinta bem sucedidas, infelizmente isso ainda é exceção, não só no Brasil. Falo isso porque penso que toda mulher deveria ser independente em tudo antes de ter um filho. Não sou contra a união de bens e divisão de despesas e tarefas, que geralmente só acontece na teoria. Mas acho que essa história de mulher depender unicamente de salário de marido ou de pensão alimentícia é uma das situações mais humilhantes. Como deveria ser visto como humilhante para o homem ter de correr o risco de ser preso para garantir o direito de seus próprios filhos.

Portanto, como não podemos protestar em carne e osso, protesto em palavras. Acho que a mulher poderia ter seus filhos quando quisesse; como também defendo o direito delas de não os terem, se assim preferirem.

Se dona Oscarina de Paiva, minha avó, ainda tivesse vista para ler isso, diria, com toda sua nordestinidade: Que coisa feia, meu filho, quem já se viu uma velha como eu, aos 90 anos, ainda parindo!

E eu perguntaria: por que não?

José de Paiva Rebouças.
Escritor e jornalista
jottapaiva@gmail.com

Texto publicado na coluna “Balada do Impostor”, no caderno Mulher do Jornal De Fato.